domingo, 26 de janeiro de 2014

O GDF TEM QUE CONHECER A ÁREA LOCAL DE SUA INTERVENÇÃO POLÍTICA

A prática política depende das relações de poder percebidas. Uma intervenção política programática que enfoque a cidadania democrática com base no poder local requer conhecimento da área de intervenção política, tanto no conjunto do Distrito Federal como em cada cidade-satélite. É necessário que se detecte como é a natureza da dominação que impera sobre cada comunidade, principalmente pela penetração do patrimonialismo, clientelismo, populismo e corporativismo. Há que se observar, também, como as pessoas aceitam a dominação como um fenômeno regular estruturado e se determinada autoridade é “desafiável” politicamente por aqueles que lhe são subordinados, com base em um processo de disputa de poder ou de luta pelo atendimento de uma reivindicação.
Deve-se reconhecer como o governo incorpora a participação popular, como se dá, na localidade, o formato constitutivo do processo decisório e o papel dos sujeitos nesse processo; demarcar se o caráter da possível participação é apenas reivindicativo e localizado, ou consultivo, se envolve efetivamente a população na discussão e na decisão das prioridades públicas para a cidade, de forma a permitir um compartilhamento de gestão ou, ainda, se os agentes públicos atuam de forma fragmentada ou em conjunto. Também é indispensável notar como o GDF se aproxima das demandas da população nas diversas cidades, como ele se articula com a sociedade civil e com os Municípios do Entorno.
Para a exequibilidade das novas missões, a administração do Governo do Distrito Federal necessitará ser reformada nos seus modelos e lógicas de funcionamento organizacional. A qualidade e a eficiência da prestação dos serviços públicos e o seu acesso generalizado a toda população articulam-se com a necessidade de se pôr em perspectiva, por um lado, as mudanças que deverão ser registradas no nível do GDF e, por outro, a oportuna descentralização de competências e atribuições respectivas. Partilhar a descentralização é estratégico para o desenvolvimento local, num quadro claro no qual as atribuições e competências estejam devidamente delimitadas, e definidas as formas de coordenação e articulação. Nesse aspecto, devem-se refletir as mazelas que afetam ou podem vir a afetar a descentralização e o poder local e apontar as vias possíveis para a sua solução.
Os diversos órgãos do poder local devem contribuir para a coesão e equidade socioeconômica; portanto precisa ocorrer a otimização dos recursos e processos públicos da administração governamental, para atender as demandas da comunidade, e não deve haver margem ao desperdício de recursos como se tem observado. O descumprimento das regras da Lei de Licitações vem ocasionando vultosos prejuízos para a administração pública e para a sociedade no DF – diagnosticam-se desde falhas formais até a “montagem” de processos, ausência de projetos básicos e falta de especificações detalhadas dos projetos a serem licitados, além disso, também é diagnosticável o registro de dados contábeis falsos.
Um planejamento estratégico que vise ao desenvolvimento social e econômico do Distrito Federal deve ser instrumento que equacione as dificuldades de recursos financeiros disponíveis no poder local, considerando com bastante seriedade a obediência à Lei de Responsabilidade Fiscal, o que pressupõe o equilíbrio das contas públicas. Ora, não há como deixar de registrar que o GDF encontra-se com suas contas em posição limítrofe, próximas de ultrapassar os limites impostos pela LRF, notadamente devido ao alto comprometimento orçamentário com despesas de custeio.
É ajustando as contas públicas que se aumentará a disponibilidade de recursos para o investimento que reforce o desenvolvimento econômico e social sustentável. Isso significará a prática de regras de conduta de moralidade jurídica. A fiscalização rigorosa das contas públicas por mecanismos comunitários do poder local deve ser não só um direito, mas também um dever cívico dos cidadãos organizados em entidades para dar conta de tal tarefa.
(Cruzeiro-DF, 26 de janeiro de 2014)

A RELEVÂNCIA DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA PARA AS DEMANDAS DE CONVÍVIO

 
A sociedade está estruturando-se numa complexidade crescentemente simbolizada pela saturação. As demandas de convívio ganham relevância significativa no preenchimento de novos papéis da democracia necessários para formar sensibilidade aos valores da tolerância, de modo a atender as exigências da fase histórica atual. Como mecanismo de inserção das demandas de convívio, a democracia participativa torna-se ferramenta política equalizadora de um novo racionalismo, a partir do empoderamento local, que dê conta do protagonismo de que as individualidades populares anseiam para se tornarem visíveis em meio a tanta saturação.
O custo do gigantismo produtor de uma cultura consumista e padronizada é que o processo econômico deixa de responder às reais necessidades dos diversos indivíduos e grupos que compõem a sociedade. O reequilíbrio entre as necessidades e as soluções econômicas e sociais passa por uma dinâmica política de ação local que transforme o modo de tomada de decisões para o desenvolvimento econômico e social, atuando como articulador de um relacionamento entre o público e o privado, de maneira a efetivar resposta às verdadeiras demandas econômicas da sociedade.
A dificuldade de realizar uma reeducação ética é o custo desse gigantismo produtor da cultura padronizadamente consumista do pós-moderno, principalmente no Brasil e nas diversas nações que se descolonizaram em um capitalismo tardio. Uma nova cidadania pode emergir do somatório das atitudes democráticas participativas que tenham por agentes os diversos entes do movimento social em várias manifestações locais.
Um sistema de dominação hiperconsumista é um chocante ataque a uma práxis que reconcilie o sentido de humanidade presente na cultura de cada homem e de cada mulher. Uma reeducação ética, valendo-se das manifestações tradicionais culturalmente introjetadas nas pessoas, pode recuperar certos valores produzidos no passado humanista, necessário para a sensibilização da contemporaneidade. O empoderamento das comunidades locais por intermédio de formas diretas de democracia é a grande saída para uma pedagogia da ética.
O gigantismo hiperconsumista ataca o meio ambiente natural, faz crescer o recalque psicossocial criado pelas desigualdades e não leva em conta o interesse público. Os esforços da sociedade têm de ser estimulados por políticas públicas estabelecidas pelo governo de maneira que o Terceiro Setor fique encarregado de promover a inclusão das parcelas da população não alcançadas pelos empreendimentos privados, defendendo-se, então, valores que garantam a igualdade e a justiça nas relações sociais.
(Cruzeiro-DF, 26 de janeiro de 2014)           

domingo, 19 de janeiro de 2014

OS ROLEZINHOS, A ERA DO HIPERCONSUMISMO E OS SHOPPINGS


   Atravessamos um estágio da cultura produzida pelo consumismo que configura novos modos de viver. A condição cultural pós-moderna cria fugacidades que tentam apagar fronteiras de classe, gênero e geração e não permitem o estabelecimento de uma ordem e planos em longo prazo.
   As condições culturais da produção consumista circunscrevem-se no meio urbano em momentos limitados e se reconfiguram muito rapidamente na finalização de desejos. São flashes no mundo contemporâneo cujas formas adquiridas não são mantidas, porém descartadas, que escapam à nossa vontade e ao próprio poder.
   Nesse aspecto, determinados espaços públicos caracterizam o encontro entre estranhos (seja nas ruas, nos shoppings ou nas universidades) que querem viver a fruição, contudo não conseguem adquirir a visibilidade que desejam obter. É essa efemeridade que se torna um desafio para as instituições.
   O “rolezinho” é uma expressão dessa busca de visibilidade para a camada da população sem acesso à produção material da nova sociedade que se estabelece em rede. É a necessidade de participar de uma nova partilha de interesses colocada em evidência pelo processo de interatividade imposto por uma nova fase da apropriação material que, apesar de instalada mundialmente, ainda não teve o tempo e o desapego necessário para criar um novo ordenamento político e jurídico que a compreenda e dela consiga dar conta. Ou seja, a Era Industrial desaguou numa era informacional geradora da sociedade em rede, mas com novas exigências tecnológicas, políticas e legislativas necessárias para fazer a própria sociedade funcionar.
   Há uma crise planetária ambiental, política, econômica, social, cultural e, sobretudo, ética. E o problema é que ninguém quer abrir mão da possibilidade de maximizar ganhos individuais, ainda que ao preço das perdas coletivas.
   A dimensão espiritual do prestígio sofre mudanças que fragilizam os encantos conservadores, transcendendo o consumo como prática da apropriação material para reificá-lo na política de escolhas cruciais à ocupação de poder social. A relação funcional que os indivíduos mantêm com as mercadorias é metaforizada em escolhas políticas, como se candidaturas, opções e até mesmo ideologias fossem “produtos” a ser fabricados, vendidos e comprados em um “mercado” lúdico de feitichização.
   Há uma nova fase histórica do consumo: a época do hiperconsumo, em que o “sempre mais” serve de base à dinâmica consumista ilimitada da demanda de renovação, da mudança pela mudança. Há incertezas provocadas pela multiplicação dos referenciais, que desorganizaram as próprias tradições em troca da lógica das marcas.
   O consumo se coloca numa oportunidade de escolha tal, que deve gerar um descarte contínuo, programando obsolescências por intermédio da propaganda das novidades. O ato da aquisição passou a ser tão gratificante em si que sobrepujou a própria posse e uso.
  A diferença existente entre a dinâmica da apropriação da produção social em seu caráter histórico tradicional e em sua fase pós-moderna está na relação do alcance do desejo e das necessidades com o essencial e o supérfluo. A forma como o mercado trata o desejo atendido, o desejo “criado” e o desejo por mais consumo estabelece a lógica de uma nova intersubjetividade fenomênica, ontológica.
   O contraste entre a forma como os shoppings atuam e como a maioria da população vive é que aqueles precisam de um contexto de fugacidade, de dinâmica de descarte, de produção de multiplicação fluida dos referenciais, dos flashes de momentos, e sua fruição requer também descarte financeiro por parte daqueles que rapidamente repõem o dinheiro despendido com a facilidade de quem tem a mais-valia à sua disposição. Quanto à maioria da população, alija-se de tal processo, pela via do lado explorado da mais-valia, embora seja hipocritamente convidada pela mídia, segundo a segundo, a participar da apropriação material hiperconsumista, escondendo dela e de seus filhos que isso pertence a um mundo do qual ela não faz parte, embora creia na existência de um bondoso Papai Noel que não discrimina ninguém e contempla a todos.
   Estabeleceu-se uma ordem em que a quantidade de inovações tecnológicas traz-nos uma sensação de obsolescência do presente que requer novas e múltiplas estratégias coordenadas, porém incapazes de orientar a ação humana no controle dos processos de mudança da sociedade.
   Assim, a capacidade de reprodução social da modernidade, atada à cultura e à ideologia hiperconsumista, perdeu sua capacidade de funcionamento e integração, levando à tendência da perda dos direitos sociais e, consequentemente, ao aumento da exclusão.
(Cruzeiro-DF, 19 de janeiro de 2014)

sábado, 18 de janeiro de 2014

A DINÂMICA DA EVOLUÇÃO PARA UMA RURALIDADE MODERNA NO DF



A área rural vem mostrando uma nova dinâmica. A procura por um ambiente natural, que se torna cada vez mais escasso devido à invasão da sociedade urbano-industrial, dá nova oportunidade de desenvolvimento territorial aos espaços rurais.
Essa oportunidade oferecida pelos espaços rurais deve ser acompanhada por políticas que viabilizem sua implantação, políticas que recuperem o potencial cultural e natural da área e criem novas oportunidades de emprego e geração de renda para os habitantes locais. Mas não bastam apenas as condições naturais e culturais oferecidas pelo meio, precisa-se também de políticas de longo prazo que as tornem mais atrativas.
Poder-se-iam definir como linhas-mestras de atuação de uma política rural no Distrito Federal a atenção prioritária ao agricultor familiar, obediência às políticas ambientais, produção de alimentos de forma sustentável com enfoque agroecológico, aumento da eficiência das linhas de comercialização dos produtos, desenvolvimento de ações que garantam a segurança alimentar, formação de parcerias que possibilitem a inclusão social dos produtores familiares, ordenamento e regularização fundiária, formação de profissionais de extensão rural, capacitação do agricultor familiar, integração dos três Estados constituintes da região de Águas Emendadas (Águas Emendadas é composto por sete Municípios do Estado de Goiás, três Municípios do Estado de Minas Gerais e pelo Distrito Federal) e promoção de parcerias para o trabalho em rede entre instituições governamentais e não-governamentais, especialmente para a pesquisa e o ensino.
É necessário procurar formas alternativas de organização para possibilitar a apropriação social da natureza, formas que podem ser tão competitivas quanto as hegemônicas vigentes (seria possível formar Conselhos de Cogestão de Produtos Nativos do Cerrado). As políticas de ocupação e de produção do território do cerrado precisam dar atenção às potencialidades do ecossistema nativo e ao conhecimento acumulado pela cultura local. Devem-se treinar os produtores rurais e suas famílias em novas técnicas de produção de alimentos. Deve-se preservar a cultura local, especialmente em agroecologia e produção orgânica. Também é importante que se possua um sistema de informatização rural, por intermédio do qual o GDF conheça toda riqueza biológica das suas áreas rurais.
O desenvolvimento rural deve conservar a biodiversidade, firmando acordos e compromissos de conservação ambiental. Políticas públicas podem incentivar a comercialização de produtos nativos do cerrado, dando isenção do recolhimento do ICMS, criando legislação distrital apropriada para certificação de qualidade dos produtos originários dos usos de nativas, produzidos em uma economia ou agroindústria familiar, que não encontrem legislação adequada para sua formalização.
Uma agricultura de precisão pode racionalizar o sistema de produção agrícola moderno e o emprego de agroquímicos, reduzindo os custos, minimizando impactos ambientais e melhorando a qualidade dos produtos agrícolas. O comércio eletrônico possibilita a compra e a venda de produtos e insumos agropecuários, além de disponibilizar informações que cobrem amplas atividades agropecuárias.
A população rural do DF ainda está distante dos benefícios da Internet, pois somente 22,6% dela têm acesso a esse serviço. Os empresários rurais necessitam investir em tecnologias da informação para tomar decisões em nível crítico de gestão; diante dessa premência, é importante identificar quais são as atividades que estão utilizando a tecnologia da informação na gestão das empresas rurais em Brasília. Apenas uma minoria dos administradores rurais utiliza a tecnologia da informação para a gestão eficiente das informações; então, pode-se aplicar a tecnologia da informação ao empresário do campo, capacitando e atualizando tecnologicamente os administradores e gerentes daquelas empresas.
Os usuários rurais internautas são desconhecidos do GDF. O uso correto da informática pode oferecer ao sistema agropecuário recursos tais como o diagnóstico de doenças em plantas ou animais a partir de informações prestadas pelo agricultor, além de cursos de treinamento a distância.
Muitas empresas do segmento agrícola não possuem técnicas de gestão devido à falta de qualificação do empresariado rural. Quando essas organizações passam a utilizar um sistema de informação, elas organizam-se e determinam-se a um método de trabalho bem definido.
Precisa-se reestruturar ruralmente o Distrito Federal, evoluindo para uma ruralidade agrária moderna, com empresa familiar, com estratégias familiares pluriativas, concretizando-se na mobilização e sensibilização, priorizando problemas, potencialidades e construção participativa das soluções. O incremento de políticas comunitárias para o desenvolvimento rural ajudará a operacionalização de programas e iniciativas da comunidade.
Uma estratégia de desenvolvimento rural há de orientar um modelo de agricultura sustentável com múltiplas funções, assim como há de proteger o patrimônio ecológico por intermédio de medidas agroambientais concentradas em cinco eixos: água, solo, riscos naturais, biodiversidade e paisagem. Dez medidas devem ser destacadas: extensão da produção agrária, as variáveis nativas de espécies vegetais, técnicas ambientais de racionalização de produtos químicos, luta contra erosão em meios frágeis, proteção da fauna e flora, economia de água fluvial, fomento da intensificação da produção, proteção de paisagem, prevenção contra incêndios e gestão integrada das explorações pecuárias.
Uma política de desenvolvimento rural deve concentrar-se na melhoria da paisagem e do ambiente rural, na promoção da qualidade de vida na zona rural e na diversificação da economia rural. A área rural do DF pede infraestrutura, amparo à saúde, melhorias na educação, emprego, saneamento rural e melhor e maior articulação do campo com a cidade – uma das maiores necessidades é crédito rural para aumentar a produção e a distribuição dos produtos no mercado.
O tamanho da população rural brasiliense e a elevação da pobreza no campo mostram a falta de investimento público na agricultura. Tem-se de estimular os programas destinados a famílias da área rural com renda per capita abaixo de um salário mínimo, criar agroindústrias e prestar assessoria para que as famílias obtenham financiamentos, desenvolvam a produção e comercializem o produto final. Assim, evoluindo para uma ruralidade moderna, o Distrito Federal poderá fazer o campo crescer economicamente, reduzindo as desigualdades sociais na área rural e preservando o meio ambiente.
(Cruzeiro-DF, 19 de janeiro de 2014)


domingo, 12 de janeiro de 2014

É PRECISO REGULAMENTAR MAIS O MERCADO FINANCEIRO MUNDIAL


Segundo o BIS, Banco de Compensações Internacionais, o total dos ativos financeiros do mundo inteiro é da ordem de cerca de US$500 trilhões, dos quais apenas US$180 trilhões são registrados. Enquanto isso, os derivativos negociados no mercado financeiro internacional orçam US$280 trilhões, e os que são negociados “fora-de-balcão” representam US$220 trilhões. Ocorre que o PIB mundial chega a US$50 trilhões; assim, a humanidade convive com uma entropia na liquidez dos ativos em torno de US$450 trilhões.
O disparate entre o tamanho do capital fictício e o do capital real desequilibra o senso de pragmatismo da operacionalidade da economia, a partir da busca de liquidez enganosa motivada por alavancagens em cadeia, baseadas em um princípio fiduciário arriscadíssimo. É uma complexa interação entre dinheiro, ganância e tecnologia, colocada em movimento pela incansável aposta em ativos que, inexoravelmente, vão acumulando-se à procura de rendimentos mais altos na célere movimentação virtual possibilitada pela globalização da economia. Essa exótica interação conforma-se como um capital que não nasceu da economia real, mas sim do enfileiramento sem fim de títulos sobre títulos, de obrigações conexas em contratos registrados ou não registrados que qualquer tremor pode destruir.
Os especuladores financeiros transformaram o mundo em um cassino. A simples troca, entre emprestar o que se tem ou o que se arrecada dos outros e emprestar o que se poderia ter, elevou o crédito a valores extraordinários, onde o que se empresta chega a ser 10 vezes o valor do que se produz, ou seja, para se pagarem todos os empréstimos, toda a produção teria que ser destinada ao seu pagamento por 10 anos.
E todos os grandes investidores sabem que podem sofrer um baque. Então, é necessário segurar-se, proteger-se contra os contratempos, daí a necessidade dos derivativos, do empacotamento de empréstimos que são transferidos para outros investidores com os bancos garantindo que o pacote e cada fatia dele vendida (resultado da junção de vários créditos concedidos, empacotados, depois fatiados em diversas porções e vendidos às porções para vários investidores) serão honrados. Além disso, é feito um seguro contra a possibilidade de haver uma quebra do contrato, e a seguradora agrega vários seguros (empacota) e os vende fatiados a novos investidores numa espiral sem fim em que, muitas vezes, um dólar cria até 500 dólares em “ativos financeiros”.
Os fundamentos do funcionamento financeiro do capitalismo, escorados na confiança mútua entre quem empresta e quem toma o empréstimo, entre quem vende e quem compra papéis sem a credibilidade necessária, têm sido constantemente postos em xeque (haja vista a crise financeira mundial de 2008), gerando a criação de direitos que podem não ser honrados.
Apesar da alentadora (mas lenta) recuperação da economia mundial, as tentativas de regulamentação no setor financeiro têm alcançado resultados tímidos, embora, após a crise internacional motivada pelos subprimes em 2008, a governança mundial tenha atentado para o fato de que é perigosíssima a liberdade excessiva concedida ao setor financeiro. A pressão dos entes privados do sistema financeiro internacional, especialmente dos bancos menores, levou o BIS a reduzir a obrigação de as instituições financeiras terem caixa para pagar credores e clientes nas operações de curto prazo e a adiar a o Acordo de Basileia III – que aumenta as reservas do capital bancário para proteger-se de uma crise financeira de liquidez, fazendo os bancos criarem um colchão de reservas de capital para serem usadas em momentos de crise.
Se o LCR (requerimento mínimo de liquidez de 30 dias para pagar todos os compromissos – de clientes e credores) já estivesse em vigor, menos da metade dos 200 maiores bancos do mundo estaria de acordo com as regras. Assim, a capacidade do sistema bancário para financiar uma recuperação da economia global é incerta; ou seja, as operações arriscadas continuam e, se derem errado, podem ameaçar depositantes e expor contribuintes a programas de resgate.
Felizmente, o grau de regulamentação e fiscalização do sistema financeiro brasileiro cumpre esses requisitos com folga, todavia não se deve incidir no equívoco de agir como se o País fosse uma “ilha”, já que, quando a rede financeira mundial quebra, todo o sistema entra encadeadamente em colapso.
A saída é regular mais o mercado financeiro, pondo-o a salvo de atividades perigosas e frívolas, como a securitização irresponsável e a proliferação de lixos tóxicos – como são os derivativos exóticos –, e aumentar os investimentos que façam crescer as forças produtivas. É preciso desenvolver a produção para aproximar a economia da realidade, diminuindo o capital simbólico. Para tanto, os governos deveriam modernizar a infraestrutura com obras públicas que ajudem a sustentar sistemas políticos que socorram os setores que enfrentam dificuldades econômicas e sociais.
Em suma, em um ordenamento globalizado, os Estados poderiam exercer um papel maior na economia mundial, daqui por diante, afinal, é função deles intervir, quando necessário, para organizar o sistema e impedir a barbárie.
(Cruzeiro-DF, 12 de janeiro de 2014)

sábado, 11 de janeiro de 2014

A PRODUÇÃO RURAL DO DF CARECE DE UM PLANEJAMENTO INTEGRADO


Faz-se necessária a formulação de novas regras da relação entre os atores envolvidos nos processo produtivos do campo e o conjunto da sociedade do Distrito Federal, consolidando a participação democrática para promover o desenvolvimento rural brasiliense. O GDF poderia estabelecer uma orientação ambiental para apoios e incentivos comunitários, e criar um Fundo Distrital de Orientação e Garantia Agrícola, como instrumento cofinanceiro que suporte as políticas comunitárias de desenvolvimento rural. As políticas comunitárias rurais deveriam centrar-se na perspectiva da valorização das potencialidades sociais e físicas dos lugares e no horizonte de conservação e proteção ambiental desses mesmos lugares, contemplando medidas compensatórias para os habitantes rurais desfavorecidos.
   Seria de grande valia um enfoque para o desenvolvimento rural do DF que enfatizasse o local na aliança entre instituições e na busca de mercados. A intervenção no espaço rural tem de procurar a paridade com os espaços urbanos e industriais, aumentar as estruturas nas atividades agrárias, proteger o meio ambiente e desenvolver a participação comunitária. Nesse sentido, é de fundamental importância para a sustentabilidade desse processo a participação das comunidades, a fim de que determinem suas expectativas de desenvolvimento, fortaleçam seu patrimônio cultural e coloquem as organizações a seu serviço.
O fortalecimento de uma rede de interesses e conhecimentos, a partir da interação com as instituições de desenvolvimento rural, universalizaria as oportunidades e potencialidades do setor agrícola do Distrito Federal. Ações institucionais estratégicas que alcancem o desenvolvimento rural sustentável contribuiriam para atender os anseios e necessidades das pessoas que vivem e produzem em regime de economia familiar.
É necessário revalorizar as áreas rurais e fazê-las crescer populacionalmente, concebendo novas fórmulas, a partir da delimitação de espaços formados pela unidade cidade-campo e da sua dinâmica territorial. A necessidade de ações voltadas para o desenvolvimento e a inclusão social no Distrito Federal põe-se para o campo da mesma forma que para a cidade, pois, em ambos os espaços, grande parte da população pobre não alcança a plena cidadania. Coloca-se, desse modo, o desafio de conseguir que as lutas cotidianas criem novas instituições – mas ainda é necessário buscar o aumento da eficiência dos atores envolvidos no processo produtivo, com investimentos que propiciem o desenvolvimento econômico e social da zona rural do DF.
Para que se tenha uma ideia, a Capital Federal é o terceiro maior mercado consumidor de flores do País, quarto no consumo per capita, contudo somente 20% desta demanda são cobertas pela produção local, e o DF importa 80% do que é consumido no setor. Aliás, o segmento de produção de flores e plantas ornamentais, no Distrito Federal, ainda é pequeno, agregando um número restrito de produtores, que possuem pequeno grau de profissionalização. A floricultura local é constituída por pouco mais de 60 pequenos e médios produtores rurais. O pessoal do paisagismo e da jardinagem do Distrito Federal é dependente dos produtos adquiridos e fornecidos pelas lojas e revendas locais que, por sua vez, também dependem das flores e plantas ornamentais produzidas em outros Estados, o que eleva os preços.
No Distrito Federal, cada hectare plantado gera, em média, quatro empregos diretos. Portanto um desafio que se tem de aceitar é o de fornecer condições favoráveis para o escoamento da produção rural familiar de forma lucrativa e contribuir para o desenvolvimento sustentável das comunidades rurais.
O crédito, a educação e a escolha do canal de distribuição são relevantes na constituição da renda da agricultura familiar, pois ela apresenta indícios de descapitalização devido à baixa remuneração de seus produtos, ao endividamento e ao baixo poder de negociação na comercialização do que produz. Em Brasília, a questão crítica para o agricultor familiar é a comercialização, o que demonstra a necessidade de enfatizar-se esse aspecto na política de fortalecimento do setor, pois o canal de comercialização afeta o valor da produção.
No caso do setor de horticultura, por exemplo, a venda direta e as negociações através da CEASA agregam maior valor ao horticultor, porém a negociação por intermédio dos grandes supermercados é desvantajosa e comprime a remuneração dos fornecedores de hortaliças, cuja renda média gira em torno de apenas 2,4 salários mínimos mensais. Embora 61% dos horticultores do DF utilizem as feiras para comercializar sua produção, a feira, ainda que se trate de canal tradicional de comercialização, não é boa alternativa, pois, geralmente, localiza-se na periferia com produtos de menor valor agregado. Além disso, 79% dos horticultores do Distrito Federal trabalham com crédito racionado, e os financiamentos são mais utilizados para o custeio da produção. Isso evidencia a importância da existência de crédito para a comercialização que melhore a renda do agricultor familiar, devido ao seu baixo poder de articulação com o mercado.
Mantém-se importante a intervenção estatal como instrumento de políticas públicas no âmbito do desenvolvimento rural. A institucionalização de políticas públicas e crédito rural consolidaria a atividade agrícola na Capital do País. A implantação dos programas de crédito rural bem como o apoio à agricultura familiar e à irrigação pode dar nova conotação à geração de renda dos agricultores do Distrito Federal.
   O Estado pode colaborar no desenvolvimento do meio rural, possibilitando maior articulação desse setor com o meio urbano a partir da consolidação de fixos, tais como os mercados de comercialização dos produtos, CEASA etc. A ação do Estado é importante na implantação das políticas para o desenvolvimento rural e para uma maior articulação da produção do campo com a cidade.
Para tanto, o Governo do Distrito Federal deveria visualizar a propriedade rural como uma empresa que precisa conhecer o mercado em que atua. Quanto maior for a interação entre governo, empresa rural, consumidores, fornecedores de insumo e bancos, melhores serão os resultados, visto que o segmento de produção rural do DF carece de sistemas de planejamento integrado.
(Cruzeiro-DF, 12 de janeiro de 2014)
 

sábado, 4 de janeiro de 2014

COMO ARTICULAR O PROCESSO PRODUTIVO URBANO-RURAL NO DF

Devido à expansão desordenada e ao surgimento dos condomínios habitacionais, fica difícil a delimitação do urbano e do rural no Distrito Federal, haja vista as características quase sempre urbanas dos condomínios em localização rural. Assim, o reconhecimento do rural, no DF, deve basear-se em sua relação com a cidade, ou seja, o urbano e o rural misturam-se. A modernização da sociedade intensificou as relações estabelecidas entre eles – nesse sentido, são espacialidades complementares e mescladas, delineando a continuidade entre o urbano e o rural em um continuum entre os dois polos.
Segundo o IBGE, 151 mil pessoas constituem a população rural do Distrito Federal. A agropecuária tem um papel relevante na economia da região do Entorno do DF: as maiores áreas são ocupadas com cultura de grãos e pastagem artificial, ficando a fruticultura e a horticultura com áreas menores. Na pecuária, predomina a criação de bovinos, seguida por suínos e equinos, extensiva a toda região. A agricultura varia desde a de subsistência até a de grandes culturas de cereais, principalmente soja, milho e feijão como também grande produção de tomate. As grandes culturas comerciais são beneficiadas por irrigação de pivô central, com a lavoura expandida em áreas anteriormente ocupadas pelo cerrado, em cujos solos são usados corretivos e fertilizantes para compensar as deficiências naturais. Porém a dinâmica do rural vai além da agricultura, está no modo de pensar, agir e construir o espaço geográfico, em um processo complexo que permuta cidade e campo, revela o rural nas áreas urbanas e reproduz o urbano em meio ao campo. Logo, o espaço agrário do Distrito Federal não pode ser imaginado com destinação exclusiva às atividades rurais, com função produtiva voltada para alimentos e matérias-primas, mas também por meio dos aspectos plurais da intensa relação cidade-campo.
A intersecção urbano-rural é responsável pela diversidade de interesses e atores locais que podem fortalecer o controle social e criar caminhos de sustentabilidade agrária. Novas políticas e práticas no campo, participação comunitária e conhecimento local são um desafio cultural e político na mediação de interesses diversos.
A modernização da sociedade nos espaços locais rurais fundamenta-se na crescente paridade social. Uma nova visão do rural propõe uma nova concepção das atividades produtivas e uma nova percepção da ruralidade como patrimônio a ser usufruído e preservado. Então, a pluriatividade é uma alternativa para fixar a população na zona rural do DF. É por intermédio da pluriatividade que os membros das famílias de agricultores residentes no meio rural podem optar pelo exercício de diferentes práticas, inclusive não-agrícolas. A partir do momento em que um determinado integrante de uma família de produtores rurais vem a exercer uma atividade não-agrícola, mas tendo suas raízes no campo, passa a executar a função de ligação entre o meio rural e o meio urbano.
O avanço da modernização das atividades agropecuárias está associado à integração da unidade produtiva às redes de produção, visando atender segmentos de mercados. Em função disso, ocorre nova divisão de trabalho no interior das unidades familiares, liberando alguns membros das famílias para ocuparem-se em atividades alheias à sua unidade produtiva – nota-se também que, por outro lado, os membros da família têm seu tempo de trabalho reduzido, possibilitando-os combinar a produção agrícola com outra atividade externa, agrícola ou não.
As atividades não-agrícolas no campo expressam a natureza multifuncional do espaço rural de hoje em dia que pode fortalecer o contexto social local e criar caminhos para a sustentabilidade rural; a prática social e econômica do campo é ampliada pela multifuncionalidade do espaço rural contemporâneo, pela participação comunitária e o conhecimento local. Desse modo, é necessário abrir, nos componentes urbanos e rurais, livre trânsito de suas economias e culturas, já que as inter-relações reconfiguram uma nova organização cultural e política.
O crescimento do emprego rural não-agrícola decorreu da modernização associada à expansão de atividades industriais e de serviços, pois, com o tempo, setores industriais começaram a buscar a zona rural para expandir suas instalações. A modernização da agricultura no cerrado, além de modificar as relações no processo produtivo, contribui, também, para o processo de urbanização do campo.
A estrutura produtiva agrícola enfrenta alterações nas relações sociais de produção pela diminuição crescente de postos de trabalho essencialmente agrícolas, além do surgimento de atividades não-agrícolas no espaço rural, as quais, embora em menor número, exigem outro perfil de trabalhadores. Contudo o uso das ocupações não-agrícolas vem sendo atividade de crescente geração de emprego nas áreas campestres, constituindo uma estratégia que garante a reprodução do grupo familiar no campo. A especialização agrícola crescente da agropecuária permite o aparecimento de novos produtos e mercados, como o de animais exóticos, por exemplo.
A pluriatividade tende a generalizar-se tanto em áreas de produção agrícola, onde o avanço tecnológico diminui a demanda de trabalho nas propriedades, como nas demais zonas rurais, onde o próprio Estado estimula o desenvolvimento de outras atividades econômicas, como o turismo e o artesanato. Esse processo pode conduzir à revalorização do espaço rural em razão do crescimento do movimento ambientalista e da descentralização industrial, que tenderão a ampliar o mercado de trabalho e o exercício da pluriatividade pelas famílias camponesas.
Como exemplo, o turismo no espaço rural constitui um importante instrumento de desenvolvimento no DF, assumindo o papel de lógicas urbanas na produção do espaço. O desenvolvimento de estratégias de ação permite melhorar a qualidade de vida das populações locais e do desenvolvimento sustentável. É necessário adequar o turismo ao meio rural, assegurando que as populações locais controlem essa integração. Não é que o turismo represente a solução para os problemas do campo no Distrito Federal, mas trata-se de uma opção empresarial que poderá trazer efeitos positivos, contrabalançando uma eventual desintegração das atividades tradicionais. Essa atividade poderá proporcionar ao meio rural uma alternativa para promoção de divisas.
No Distrito Federal, o recurso a atividades não-agrícolas é uma característica intrínseca à agricultura familiar, como uma estratégia de reprodução social do grupo doméstico frente a situações adversas. É certo que a terra e a atividade agrícola passam a ter novos contornos, e a ocupação agrícola dá lugar a uma diversidade de funções, como chácaras de recreio, pousadas, hotéis-fazendas, guarda-tudo, proporcionados pela relativa proximidade da cidade e valorização do espaço agrário.
Tal fato está ganhando significação no Distrito Federal. Acompanhando a tendência histórica da contemporaneidade, é preciso formular práticas de desenvolvimento rural integrado: políticas agrárias e agrícolas para o fortalecimento da agricultura familiar juntamente com políticas de geração de novas oportunidades de emprego não-agrícolas.
Deve-se direcionar o foco da implementação de políticas agrícolas e agrárias, voltando-as para a mão de obra do pequeno produtor rural familiar. Seu trabalho é uma atividade existencial, necessário para a continuidade da vida, para a produção da vida material como meio possibilitador de satisfação das necessidades básicas. Uma agricultura é sustentável quando proporciona a total subsistência e o rendimento econômico para que o agricultor possa sustentar a si e à sua família, sem precisar comprar, na cidade, produtos de alimentação básica que poderiam ser cultivados em sua propriedade. Por esse motivo, o maior desafio encontra-se na inserção da pequena propriedade rural familiar no processo de agregação de valor em razão da pequena escala de produção e de problemas de gestão. O desenvolvimento local sustentado passa pelo processo agro-industrializante associado à pequena propriedade familiar, como fator gerador de valor adicionado, e pela manutenção da biodiversidade de culturas.
Afinal, o desenvolvimento não se sustenta sem crescimento econômico, e se origina na produção e na geração de emprego e renda.
(Cruzeiro-DF, 5 de janeiro de 2014)

O SISTEMA DE TRANSPORTE DO DF REQUER ALGO EXTRAORDINÁRIO, DIFERENTE

O transporte é fundamental para qualquer indivíduo ter acesso a serviços e benefícios sociais. Mais do que isso, é um direito humano inscrito na Constituição. Portanto, quando um sistema de transporte é inacessível para uma pessoa ou para um segmento social, ele produz um efeito em cascata perverso que inviabiliza o acesso a todos os demais serviços e os sujeita a viver de forma isolada ou subumana.
Uma das missões do Governo do Distrito Federal deveria ser a de promover a eficiência do setor de transportes, visando a impactos positivos na segurança pública, meio ambiente, educação, saúde, energia, movimentação urbana, crescimento econômico. É que o meio urbano, a cada dia, apresenta-se mais ambientalmente insustentável, o aquecimento global fica mais evidente, sendo o modo de deslocamento um potencializador desse agravante.
O transporte coletivo, pelo número de pessoas que conduz, é menos poluente e deve ser priorizado, além dos meios alternativos, como a bicicleta. Por isso, torna-se necessário o estímulo a uma mudança de hábitos da população, que dê preferência aos meios não-motorizados sobre os demais, assim como os serviços de transporte coletivo sobre o individual. É preciso convencer as pessoas de que há outras maneiras de se sentir engrandecido além de ter seu carro próprio e fazê-las compreender que o uso desordenado do automóvel nos deslocamentos individuais já não pode garantir a mobilidade da maioria dos cidadãos.
A ampliação do sistema viário é uma possibilidade que se extinguirá em breve no Distrito Federal (já se necessita, nesta cidade, de 32 km de novas vias por ano). Não há como, do ponto de vista orçamentário, financiar esse volume de obras e também não há espaço físico para fazê-lo. Já o metrô, por ser subterrâneo, não demanda demolições ao longo das vias, como ocorreria no caso do aumento e ampliação das ruas e avenidas.
É importante unificar o sistema de transporte coletivo no DF, com ônibus, metrô, veículo leve sobre pneus ou sobre trilhos e trem operando em conjunto por meio de terminais de integração. As interligações entre os grandes modais (ônibus, metrô, trem e VL) e o transporte alternativo de bicicletas devem ser estimuladas, com ciclovias ligando bairros a grandes terminais de integração. O transporte de massa é eficiente quando combina qualidade, pontualidade e preço. A integração é a palavra-chave. Assim, a transformação desse caos atual em uma matriz de transporte que priorize o coletivo deveria envolver a ação do Governo do Distrito Federal, combinada com a prática cidadã, alicerçada em um programa consistente e persistente de educação e conscientização. A implantação de um sistema sustentável de transporte no Distrito Federal garantiria a qualidade de vida e também refletiria positivamente na área de habitação, pois o alcance da moradia completa passa, obrigatoriamente, por um bom sistema de transporte coletivo, que garanta locomoção com dignidade e acesso ao direito de ir e vir da população.
Os modos não-motorizados constituem uma alternativa válida ao atual modelo de deslocamento. A infraestrutura especial para pedestres e ciclistas ainda é muito reduzida. As ofertas de vias exclusivas para pedestres são de 0,02% do total do sistema viário da Capital da República, e a oferta de ciclovias e de ciclofaixas são de 0,45% do sistema viário urbano brasiliense, bem como a oferta de estacionamentos especiais para bicicletas também é extremamente pequena (deve-se levar em consideração que, hoje, são feitas mais de 50 mil viagens de bicicleta por dia no Distrito Federal).
O governo local poderia fomentar o debate com a população sobre o uso sustentável da bicicleta no DF, com a participação de técnicos, especialistas, usuários de bicicleta e autoridades. Seria mister acrescentar a instalação de bicicletários e criar a cartilha da bicicleta, contendo informações úteis aos ciclistas para garantir sua segurança e a dos outros usuários das vias públicas.
O uso da bicicleta é uma solução que aproveita o terreno plano de grande parte do DF, e que já é adotado como meio de transporte em vários países e em muitas capitais do mundo. Várias cidades europeias demonstram todos os dias que o objetivo da diminuição do uso individual do automóvel não é apenas desejável, mas também plausível. Na capital da Dinamarca, Copenhagem, vivem 1.300.000 pessoas, e um terço delas usa a bicicleta para ir e voltar do trabalho. Podemos expor, ainda, o exemplo de Bogotá, na Colômbia, que criou 180 novos parques e quase 200 km de vias para uso de bicicleta – o que levou os cidadãos a compreenderem a necessidade de a cidade incluir as pessoas, e não os automóveis.
Outro aspecto para o qual o GDF deve voltar a sua atenção é o de que, no Distrito Federal, falta o modal ferroviário convencional no transporte urbano e em médias e longas distâncias, que ofereça rapidez, conforto e baixas tarifas para os usuários, reduzindo a emissão de CO² e ajudando na revitalização de setores populares, que se encontram em estado de degradação. O trem regional é um sistema barato porque, além de ser movido a diesel, aproveita uma faixa de domínio existente, exigindo uma demanda menor de passageiros por hora. O trem regional ligaria o Plano Piloto ao Entorno e a algumas cidades do DF, em distância média de 70 km.
Logo, reativar as linhas férreas que se encontram entre a antiga Rodoferroviária e Luziânia serviria para transportar, no mínimo, 66 mil pessoas por dia, efetuando integração com o metrô, provavelmente no Guará, e seguir até a Rodoferroviária para realizar a integração com linhas de ônibus ou de veículo leve sobre pneus. A instalação seria relativamente barata, porque a linha férrea já existe, embora seja necessário construir as estações e reformar os vagões, que são de propriedade da União e estão parados em depósitos em São Paulo. Com o trem, o tempo da viagem de Valparaíso a Brasília baixaria para 26 minutos.
Em suma, o caos no sistema de transporte no Distrito Federal chegou a um ponto que não dá para empregar uma resposta convencional. Requer algo extraordinário, diferente. Trata-se de um direito da população que precisa ser construído coletivamente, abrindo a discussão aos diversos setores da sociedade para participarem de um debate que apresente idéias e soluções para os complexos problemas do trânsito e do transporte na Capital da República.
(Cruzeiro-DF, 5 de janeiro de 2014)